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BIENAL SESC DE DANÇA – CONEXÕES

31 outubro 2009 Nenhum comentário

Vivemos “crise de crescimento” nessa região de quase 2 milhões de habitantes: o Litoral Paulista, onde o Brasil começou como civilização. Nosso grande questionamento é como e quanto o impacto do progresso econômico vai refletir na Alma compartilhada, na nossa “convivencialidade” telúrica, naquilo que denomino “desejo” do espírito, “tesão” das subjetividades interelacionadas: Cultura.  Santos, como epicentro dessa micro-cosmo regurgitando idéias, só conta hoje com 2 grandes eventos de repercussão internacional: o “Festival Música Nova” , fruto da resistência do genial compositor Gilberto Mendes e essa instigante “Bienal Sesc de Dança”: provocador de mentalidades, inquietando criticamente a observação do Ser a partir do gestual  e da “fisicalidade” eloqüente: sinestesia “quântica” entre o espaço cênico e a expressão anímica mais profunda : o lance de dados da epiderme exalando signos carregados de significados.  Não se trata mais do “ballet” tão somente: é a dança como convergência de todas poéticas do movimento: as conexões que interrogam o fluxo, o Devir, a fixação ainda que precária da fugacidade em nosso mundo em transe.
Essa Bienal sugere justamente aquilo que denominamos: ´´transmodernidade”: a “ultrapassagem”´ dialética sem síntese da antropofagia, a instauração da “arte do estilhaço”: a interconectividade do tudo-todo-ao-mesmo-tempo , o “simultaneismo” intertextual onde a dança conversa com todas demais gêneros e desdobramentos artísticos semeando mais e mais interpretações a partir do experimento tendo como suporte o prosaico “infinitizado”: o corpo com matéria-prima da Poética visceralmente inscrita em carne-viva.  Num momento  em que devemos enfrentar os 2 dragões que assolam nosso estágio de incertezas: a barbárie e niilismo paralisante, criar é transgredir, nada mais subversivo que Arte : a dança é com a Poesia, sendo ela mesmo poesia corporificada, a expressão seminal da ´´transmodernidade:  o pós-tudo dessa “regurgitofagia” que se justifica pelo tanto a ser dito com olhar brasileiro conectados com mesmo ´sentimento atlântico do mundo´.  Nenhuma outra localidade poderia enfeixar todos predicados propícios a verbalização pela dança ambientados num “topos” onde água, porto, errância e fixação estivessem tão acolhidos como elementos das “conexões” propostas em “Tempos Líquidos”, citando o pensador maior de nossa era: Zygmunt Bauman.
Enfatizo importância da Bienal para Santos pela visibilidade que dá esse porto mágico onde o “Aleph” de Borges fez morada e a adequação desse mesmo cais andante que viu Niijinsky e Massine se apresentarem.
A Bienal de Dança tem o poder mudar o espaço, motivar sensibilidades e deitar rizomaticamente raízes fecundantes germinando possibilidades de “conexões” assindéticas: experimentações sem fecho, sem síntese, como obra aberta a disposição do interpretante que completa o alinhavado lírico ou trágico do artista em pouso ou repouso em pugilato com o absurdo ou com o ar. Dança como argüição da condição humana: o vazio refletindo-se como movimento diante de luz do nada.
Dança enquanto fenomenologia poética vivificada.
Recorro outro pensador fundamental, Mauro Maldonato, autor do já clássico “Raízes Errantes”, editado pelo Sesc-SP em conjunto com Editora 34: “Estar ‘mareado em terra firme’. Receávamos acontecesse. Talvez por isso tenhamos hesitado tanto em pensar o outro. Agora , porém, somos chamados a responder. ´Para´ o outro. ´Sobre´ o outro. ‘Pelo’ outro.”  Aí estão as conexões como imperativos categóricos para o humano, demasiado humano. Sobre dança, Maldonato ainda nos pode dizer: “É interrogação que não busca respostas. A única resposta ‘a altura de suas perguntas é o silêncio. O silêncio que faz regressar ‘a pátria do deserto. Um silêncio que dá lugar ao lugar e devolve a palavra a sua promessa, deixando ao outro as chaves para libertar a palavra de seu isolamento”. Aqui começo minha mirada por todas as perspectivas dessa minha retroalimentação muito íntima entre a palavra eivada do silêncio e a o silêncio rompido pelo gesto não prescindindo da palavra, mas carregando em sua brutal imanência: Dança! a palavra ainda em estado de gênese, magma, metáfora do molde e concretude que  vão parir a linguagem  em sua plenitude…

[Flávio Viegas Amoreira
Escritor, jornalista, crítico literário e semiólogo]
flavioamoreira@uol.com.br

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